O papel da bioética no enfrentamento do racismo
Resumo
O objetivo deste artigo é apresentar reflexões sobre o racismo, trazê-lo para os dias atuais e pensar, por meio da bioética, formas de torná-lo visível, de compreendê-lo e de enfrentá-lo. Metodologicamente, foram apresentadas, inicialmente, reflexões sobre o racismo e a raça, a partir da perspectiva histórica levantada pelo autor camaronês Achille Mbembe; posteriormente, com base em revisão bibliográfica de artigos produzidos em universidades norte-americanas, travou-se discussão sobre a presença do racismo na agenda bioética e se estaria esta preparada para enfrentar a questão; por fim, abordou-se a posição da bioética latino-americana relativamente ao tema do racismo e sua preocupação com as questões sociais persistentes. Concluiu-se que a bioética deve, sim, enfatizar o debate sobre o tema do racismo, as operações de poder, hierarquização e seus impactos nos dias atuais, de modo a continuar atuando de forma verdadeiramente crítica no combate das inequidades.
Conclusão
Este artigo procurou trazer reflexões sobre a importância da bioética na discussão de questões relacionadas às práticas racistas ainda presentes em nossos dias. Demonstrou-se que a bioética dos países norte-americanos – que só agora parecem querer despertar para as consequências da colonialidade, para a necessidade de se combater o racismo e se proteger a diversidade cultural – ainda tem como preocupações centrais a pesquisa, as questões biomédicas e os avanços tecnológicos relacionados à saúde. A América-latina, por sua vez, apresenta uma bioética muito mais ampla, voltada não só às questões relacionadas à pesquisa e à saúde, mas também preocupada com a justiça social, a promoção da equidade em saúde e a garantia de iguais oportunidades a todos. Daí sua luta contra o imperialismo moral e sua busca constante pela reparação das situações persistentes de injustiça e iniquidades sociais. Com efeito, a bioética, enquanto ética concreta preocupada também com as questões sociais persistentes, deve enfatizar o debate sobre o tema do racismo, sua história, as operações de poder e hierarquização, e seus impactos nos dias atuais, de modo que possa atuar de forma verdadeiramente crítica no combate das inequidades. Embora, de fato, muito ainda se tenha a fazer para se atingir uma bioética global, voltada a questões de interesse de todo o mundo, é possível sentir um avanço no sentido de se uniformizar sua linguagem e de se respeitar a diversidade cultural, e esse avanço tem sido conseguido sobretudo com o ativismo dos países do Sul. Assim, além da importância da familiarização com a filosofia africana, da eliminação dos vieses raciais que persistem nos sistemas de saúde, do engajamento ativo para obtenção de mudanças comportamentais e institucionais, da diversidade cultural na academia e do ativismo voltado a ações e mudanças, conforme defendido na literatura, a bioética deve estar, ainda, sempre atenta à busca de políticas capazes de garantir a plena igualdade das pessoas, num contexto de diferenças.
Autora: Denise Gonçalves de Araújo Mello e Paranhos.
Fonte: https://bioetica.catedraunesco.unb.br/